
Nos últimos 150 anos a humanidade adotou um sistema linear de extração, consumo e descarte de materiais.
Pois com o desenvolvimento da fabricação em massa, a produção e consumo aumentaram drasticamente.
No entanto, esse modelo se mostrou extremamente prejudicial ao planeta.
Pois a demanda aumentada superou a capacidade da natureza de repor seus recursos e absorver resíduos.
Por isso, é necessário uma mudança urgente nos modelos de produção.
Para tal, a Biomimética é uma das soluções.
Nesse post veremos a aplicação da Biomimética na Moda e como a natureza inspira roupas mais sustentáveis.
Uma crise ecológica

Estamos diante de uma crise ecológica e receosos pelas condições futuras do planeta.
Para isso, as indústrias precisam transformar o seu modo de conceber e produzir.
Inclusive o setor da moda, um dos mais poluentes do mundo.
Uma economia circular pode reverter essa situação, utilizando um modelo baseado na reutilização de recursos.
Pois nesse modelo, as emissões, subprodutos e bens danificados – que encaramos como lixo – tornam-se matéria-prima e insumos para um novo produto.
Para criar esse modelo sustentável, a natureza pode servir de inspiração.
Uma vez que seu “sistema de gerenciamento” de recursos e energia é altamente eficiente, renovável e sem desperdícios.
A abordagem que procura soluções sustentáveis para os desafios humanos, imitando padrões e estratégias da natureza é a Biomimética.
Biomimética e Moda Circular

O conceito de Moda Circular foi criado em 2014 pela Dra. Anna Brismar e a equipe de sustentabilidade da H&M.
Eles se basearam nos princípios de economia circular e do desenvolvimento sustentável.
Dentro desse conceito, roupas, sapatos e acessórios devem ser criados para serem duráveis, biodegradáveis, não tóxicos e recicláveis.
Assim, o seu ciclo de vida causará pouco ou nenhum impacto ambiental ou social.
Para conceber esse tipo de produto, designers de moda estão aprendendo com a natureza maneiras de produzir roupas funcionais e inteligentes.
Tais roupas não só vão melhorar a nossa qualidade de vida mas também ajudarão a preservar a vida no planeta.
Como a Biomimética é a ciência que estuda as estruturas biológicas, suas funções, estratégias e processos, aplicá-la à moda é uma revolução.
Porque possibilita criar soluções inovadoras e sustentáveis, sendo uma das principais ferramentas na geração de uma Moda Circular.
Aplicação da Biomimética na Moda
As primeiras invenções inspiradas na natureza para criação de produtos do setor de vestuário foram concebidas no século 20.
Por exemplo, o velcro e o conceito de camuflagem, usados em uniformes e equipamentos de guerra.
O termo camuflagem vem da palavra francesa camoufler (disfarçar).
Foi introduzido pela primeira vez pelos franceses durante a Primeira Guerra Mundial.
A princípio, o objetivo era ocultar pessoas e objetos da vista de todos, semelhante ao artifício utilizado por muitos animais na natureza.
Já o velcro, outra palavra que provém do francês: é a combinação de Velours (veludo) e Crochet (gancho).
Trata-se de uma invenção inspirada nos ganchos da semente (carrapichos) de bardana e patenteada pelo engenheiro George de Mestral.
Uma nova geração de roupas
Através da biomimética, uma nova geração de roupas e tecidos inteligentes terão funções que vão além de simplesmente vestir.
Pois serão vestimentas hidrofóbicas, autolimpantes, antivirais etc e que vão interagir com os nossos corpos e ambiente à nossa volta.
Biomimética na moda
Conheça agora 06 exemplos de aplicação da biomimética na moda.
1) Threadsmiths – Camisetas que repele manchas

E se houvesse uma camisa à prova de manchas?
Pois a empresa australiana Threadsmiths desenvolveu camisetas impermeáveis, projetadas com nanotecnologia.
Essa nanotecnologia funciona alterando a estrutura molecular do algodão para que os líquidos à base de água não possam aderir à superfície do tecido.
Dessa forma, as camisas são capazes de repelir manchas e sujeiras como molho de tomate, café, refrigerante etc.
Elas imitam as propriedades hidrofóbicas das folhas de lótus, uma planta aquática de folhas flutuantes.
2) Nikwax – Materiais impermeáveis

A empresa Nikwax estudou focas e outros mamíferos encontrados em climas frios e úmidos.
A finalidade era entender como a pele desses animais repele a água enquanto afasta o vapor de água do corpo.
A partir disso, os engenheiros de produto imitaram a maneira como a pele gerencia a umidade e projetaram o tecido Analogy® .
Tal tecido tem a propriedade de desviar o vento e a chuva enquanto direciona o suor para longe do corpo.
Os tecidos da Nikwax protegem da chuva, condensação e transpiração.
Pois repelem a água do corpo exatamente como a pele, tornando as pessoas mais confortáveis e protegidas ao ar livre.
3) Páramo – Tecidos inteligentes

Fundada pelo inventor e empreendedor Nick Brown, a Páramo é uma marca especializada em roupas para ambientes externos.
Nick criou um tecido tecnológico inspirado no mecanismo de transpiração das árvores.
No processo de transpiração, aberturas nas folhas das plantas semelhantes a poros abrem e fecham para liberar vapor de água no ar.
Então, o tecido criado por Nick, ao emular o mecanismo das folhas, retém o ar próximo à pele, afastando a umidade do corpo.
Dessa forma, impede a entrada de umidade externa, o que proporciona o máximo conforto ao usuário.
Atualmente, a Páramo utiliza os tecidos da Nikwax em sua linha de roupas duráveis e reparáveis.
4) Morphotex – Fibras coloridas sem corantes

O Morphotex é a primeira fibra estruturalmente colorida do mundo.
Ou seja, dispensa o uso de corantes ou pigmentos e foi inspirada na estrutura microscópica das asas da borboleta Morpho, nativa da América do Sul.
A cor vívida na superfície superior na asa da borboleta é formada pela cor estrutural ou física, e não pela cor química.
Isso é resultado de escalas microscópicas e sobrepostas as quais amplificam certos comprimentos de onda da luz e cancelam outras luzes.
Da mesma forma, o Morphotex depende da estrutura das fibras e dos fenômenos físicos das características da luz.
Tais como reflexão, interferência, refração e dispersão para produzir sua opalescência.
5 – Spintex
Que tal uma seda tecnológica?
Foi exatamente isso que a Spintex produziu.
Para isso se inspirou nas aranhas.
Pois elas têm a capacidade de transformar proteínas líquidas em uma seda sólida.
E essa seda, resistente e flexível, é um dos materiais biológicos mais fortes do mundo.
Para produzi-la, a aranha não precisa de calor e nem de insumos químicos.
A empresa Spintex Engineering desenvolveu uma solução tecnológica que imita a capacidade da aranha de tecer o fio de seda.
Portanto, o resultado é uma fibra têxtil biodegradável, cuja produção ocorre em temperatura ambiente e sem o uso de produtos químicos agressivos.
Ademais, o processo é muito mais eficiente, em termos de energia, do que o utilizado para criar as fibras sintéticas à base de petróleo.
6 – Werewool
A Werewool utiliza biotecnologia para identificar estruturas de certas proteínas encontradas na natureza.
Assim, é capaz de projetar fibras para criar têxteis sustentáveis com propriedades inerentes, como cor, controle de umidade e elasticidade.
A equipe cultiva fibras compostas de proteínas vibrantes e naturalmente fluorescente as quais dependem de proteínas estruturais em vez de pigmentos.
Uma dessas proteínas é a RFP (proteína fluorescente vermelha) encontrada em algumas espécies de Discosoma, um parente do coral.
Desse modo, conseguem desenvolver fibras biodegradáveis, com propriedades estéticas e de desempenho personalizadas.
Tudo isso sem a necessidade de corantes tóxicos e sintéticos à base de petróleo.
Processos sustentáveis
Agora, veja outros sete exemplos de empresas que utilizam processos ou insumos sustentáveis para fabricar tecidos, vestuários e outros materiais ecológicos.
Piñatex™ – Tecido de fibra de abacaxi

A designer espanhola Carmen Hijosa criou um novo têxtil utilizando fibras de folhas de abacaxi: o Piñatex™.
Isso foi resultado de sua busca por matérias-primas naturais e sustentáveis que servissem de alternativas ao couro.
Como insumo, utilizou as fibras de folhas de abacaxi, um subproduto da colheita, normalmente descartado.
Ou seja, uma matéria-prima mais sustentável, que não requer recursos adicionais como água, fertilizantes ou pesticidas.
Após o processamento, essas fibras se tornam um tecido resistente, flexível, macio, leve e arejado.
Mas também de longa durabilidade.
Ele pode ser aplicado na confecção de materiais como bolsas, sapatos e roupas.
Colorofix – Pigmentos naturais

A startup inglesa Colorifix desenvolveu um tipo de corante têxtil sustentável, utilizando biologia sintética para ajudar a indústria a reduzir o seu impacto ambiental.
Esse processo biológico utiliza bactérias geneticamente modificadas.
Elas produzem pigmentos naturais diretamente sobre os tecidos.
Isso, por sua vez, permite reduzir o uso de água e energia.
Além disso, o processo dispensa o uso de metais pesados, solventes orgânicos ou ácidos,
Por isso, melhora drasticamente a sustentabilidade do tingimento e tratamento de tecidos.
Qmonos – Tecido resistente

A empresa japonesa “Spiber” desenvolveu uma seda artificial chamada Qmonos.
Para isso, usou certos genes do DNA da aranha que foram sintetizados e incorporados em bactérias.
Em seguida, essas bactérias passam a produzir fibroína, uma proteína estrutural encontrada na seda de aranha.
Já que a teia de aranha, na mesma base por peso, possui cinco vezes mais resistência que o aço, imagine um tecido imitando essas propriedades.
É o caso da seda Qmonos!
Os pesquisadores da empresa desenvolveram tecnologias para cultivar essas bactérias de uma maneira eficiente e tecer a fibroína em tecido.
Portanto, temos uma seda artificial mais resistente do que a kevlar e mais flexível do que o nylon.
Algalife – Tecidos e corantes de algas

A Algalife é uma empresa alemã-israelense que produz tecidos e corantes a partir de algas.
Para isso, utiliza um sistema benéfico tanto para a saúde dos consumidores como para o meio ambiente.
Esse processo de cultivo de algas utiliza energia solar e reduz drasticamente o uso de água.
Por isso, tem desperdício praticamente zero.
Sendo assim é altamente sustentável!
O resultado é um produto 100% livre de química nociva e pesticidas, de fontes renováveis e biodegradáveis.
Benéfico à saúde
Esse tecido biotecnológico tem propriedades benéficas à saúde, pois libera antioxidantes, vitaminas e outros nutrientes na pele.
Além disso, os corantes são livres de produtos químicos e alergênicos.
Bolt Threads – Couro de Cogumelos

Já imaginou um tecido que imita couro e é feito à base de cogumelos?
Pois a empresa Bolt Threads o criou!
A fim de produzir um material biodegradável, flexível e durável ela utilizou micélios de cogumelos e criou o Mylo™.
O processo de fabricação do Mylo™ é feito através do cultivo de micélios que são produzidos em dias.
E ao contrário da fabricação de couro natural, reduz o impacto ambiental.
Pois a produção de couro natural tem como uma de suas fontes o gado, cuja criação gera gases de efeito estufa.
Além disso, consome uma quantidade enorme de água e produtos químicos nocivos.
O couro sintético usa tecidos sintéticos revestidos de poliuretano ou PVC, cuja produção é altamente poluente.
Mas a base do Mylo™, no entanto, são os micélios e sem a adição de produtos químicos nocivos.
Ou seja, um processo muito mais sustentável e correto.
E um tecido que pode substituir o couro real e o sintético!
Faber Futures – Tingimento sustentável

Faber Futures é uma empresa britânica de biodesign.
Ela promove a colaboração entre pessoas criativas e cientistas.
A finalidade é a criação de produtos inovadores e sustentáveis.
Natsai Audrey Chieza, é designer e fundadora da empresa.
Mas também, é uma das principais representantes do movimento de biodesign.
Ela e sua equipe, trabalhando junto com a Ginkgo Bioworks, desenvolveram um novo método ecológico para tingir tecidos.
Para isso eles usaram bactérias e um processo de fermentação.
A finalidade é criar corantes que não desaparecem com o tempo.
Esse processo usa 500 vezes menos água do que técnicas de tingimento convencionais.
Portanto, elimina totalmente o uso de produtos químicos prejudiciais.
Dalila Têxtil – Tecido antiviral

Na natureza, muitos animais produzem substâncias em sua estrutura externa que combatem micro-organismos.
É o caso da pele do tubarão, por exemplo.
De forma similar, também podemos usar roupas com acabamento antiviral e antibacteriano as quais nos protegem contra agentes infecciosos.
Pensando nisso, a empresa brasileira Dalila Têxtil desenvolveu uma malha com tecnologia que utiliza partículas de prata (antimicrobiano).
Seu mecanismo de ação bloqueia a ligação do vírus em células hospedeiras.
Assim, inibe sua proliferação e persistência no tecido.
O material é eficiente contra diversos tipos de vírus (incluindo o coronavírus) e bactérias.
Isso foi comprovado através de testes laboratoriais que seguem as normas científicas.
Biomimética é diferente de Design Sustentável
Esses últimos exemplos citados são inovações importantes para tornar a Indústria Têxtil mais sustentável.
Mas eles não podem ser considerados como produtos resultantes da aplicação da biomimética na moda.
Isso porque a Biomimética não é apenas sobre criar produtos que utilizam insumos e processos ecológicos.
Mas também sobre se inspirar-se nos seres vivos.
E assim, aprender com suas nas estratégias, aplicando-as na resolução de problemas.
Quer saber mais sobre Biomimética?
Então, leia : Biomimética: como a natureza inspira inovação: princípios, metodologias e aplicações.
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